Estudar ou trabalhar em outro país colabora para ganhar fluência em outro idioma e expertise como
profissional de Educação Física.
Aprender outra língua, adquirir a vivência de outra cultura, conhecer novas pessoas e paisagens e ainda poder aprimorar a
carreira são alguns dos motivos que levam muitos
profissionais de Educação Física a buscar no
exterior uma nova oportunidade.
Vencer a saudade de casa e as diferenças culturais podem ser desafiadores, assim como compreender que em muitos países, a
Educação Física não é encarada como aqui no Brasil. Ricardo Mendes, preparador físico e proprietário do Studio RM23 Fitness (
http://rm23.com.br),
da capital paulista, já trabalhou em países como Itália, Espanha,
Rússia e Inglaterra e conta que uma das grandes distinções entre o
Brasil e os países da Europa está no fato de que não existe um curso de
formação universitária como os nossos, com duração de quatro anos. “Pude
perceber que na Itália, por exemplo, o pessoal foi se esforçando ao
longo dos anos e hoje há ótimos profissionais. O fato de terem por lá a
maior empresa de fitness do mundo, a Technogym, também ajudou, porque
ela capacita muitos profissionais”, diz o trainee master da empresa.
Profissionais de Educação Física brasileiros são bem recebidos lá fora
A aceitação dos
profissionais de Educação Física no
exterior
é boa mesmo onde a validação do diploma não é necessária. Marcio de
Oliveira, ex-campeão brasileiro de ginástica artística e ex-campeão
mundial de ginástica aeróbica (www.mdoliveira.zumba.com), que atualmente
mora em Köln, na Alemanha, lembra que a
profissão de Educação Física
tem se desenvolvido muito, “pois estamos em uma fase na qual mais de
30% da população mundial está com obesidade, não só por causa da
alimentação, mas também por falta de exercícios e movimentos corretos.
Dessa forma, o profissional dessa área está sendo muito procurado tanto
para treinos individuais como em grupo”.
Considerado uma referência em fitness em alguns países, o
profissional de Educação Física
pode até mesmo serem um chamariz para as aulas no exterior, como
aconteceu com João Marcelo Siqueira, de Florianópolis (SC), que viveu na
cidade de León, na Espanha, entre fevereiro de 1997 e fevereiro de
1998, em um intercâmbio. Siqueira estava cursando o sétimo período da
faculdade e logo conseguiu um emprego em uma academia da cidade de cerca
de 200 mil habitantes. “Eu sempre trabalhei com fitness e, dentro do
fitness na Espanha, não é necessário ser formado para atuar com
Educação Física, já que a profissão ainda não foi regulamentada por lá. Por estar estudando
Educação Física,
eu senti uma grande vantagem. Trabalhei em uma grande rede de
academias, a Body Factory, dando aulas de RPM, Bodycombat e Bodypump.
Quase no fim da minha estadia por lá, quando estava falando com fluência
e quase sem sotaque, meu chefe me pediu pra não perder o sotaque porque
ele queria que as pessoas soubessem que eu era brasileiro”, lembra.
“Na
área de fitness, o profissional brasileiro tem boa chance no
treinamento de ginástica em grupo, pois o movimento não tem a barreira
do idioma, necessário no treinamento individual. Nas aulas
pré-coreografadas ou livres, somos bem-vistos e cobiçados a nível
mundial desde a década de 80, quando nossos instrutores ‘exportaram’
nosso estilo e criatividade com ótima qualidade de trabalho. Por outro
lado, as dificuldades existem e as maiores são as culturais e sociais. O
‘jeitinho brasileiro’ deixa de existir e funciona maios a razão que a
emoção. O idioma e seus dialetos são difíceis e o clima conta muito: as
temperaturas são extremas pra gente”, lembra Oliveira.
Qualificação profissional é fundamental para trabalhar no exterior
“Acho que pegar uma mochila e cair no país de paraquedas é complicado nos dias de hoje. Assim, acho que a primeira coisa que o
profissional de Educação Física
deve conseguir é uma indicação de trabalho e de cidade e, ao definir o
país para o qual vai, tem que saber a língua. Tem muito brasileiro
espalhado pelo mundo, trabalhando em resorts e pode fazer contato para
pegar uma indicação, já que muitas empresas se interessam em ter alguém
que fale Português”, indica Mendes, que destaca que mesmo em países que
têm abertura para o nosso povo, muitas vezes é preciso um visto de
entrada e permissão para trabalhar, o que requer pesquisa prévia por
parte do interessado.
Geovana Peres está na Nova Zelândia trabalhando com
Educação Física
e acha que as nossas qualificações e regulamentações são melhores do
que lá. Do outro lado do mundo, ela conta que a área oferece muitas
oportunidades, mas também muitos desafios e para ter uma chance no
exterior é preciso: “saber se comunicar bem na língua do país, conhecer a
cultura e como as pessoas se relacionam, pesquisar o mercado de
trabalho, se informar sobre quais são as exigências do país para atuar
na área e segui-las, seguir as leis do país de uma forma geral e estar
disposto a trabalhar em dobro e apresentar qualidades que as pessoas
daquele local não possuem”.
Na Nova Zelândia a experiência
comprovada é que conta: “nossas qualificações do Brasil não têm muito
valor lá fora, a menos que você contate o órgão responsável do país que
pretende ir e faça uma avaliação do diploma pra conseguir a validação ou
equivalência naquele país”, orienta Geovana, que diz que o processo é
longo, caro, estressante e sem garantias, já que caso a instituição na
qual o aluno se graduou não estiver na lista reconhecida pelo país,
provavelmente o diploma não será validado na outra nação.
“É um
recomeço em todos os sentidos quando se está no exterior. Para ter uma
ideia, tive que passar por avaliações para obter as qualificações
exigidas para trabalhar na Nova Zelândia, me qualifiquei em outras áreas
e, além disso, é obrigatório o curso de primeiros socorros que deve ser
refeito a cada dois anos. Para ser um
profissional de Educação Física
reconhecido nacionalmente também tem que se registrar no conselho do
país, o que não é obrigatório”, destaca. Por ter trabalhado por oito
anos como treinadora da Body Systems, Geovana conseguiu comprovar
experiência e habilidades e conseguiu emprego no exterior por conta
própria, sem intermédio de empresas ou agências.
“Não conheço nenhuma empresa que coloque os
profissionais de Educação Física
em academias do exterior. Se o profissional for capacitado, interessado
em estudar e conhecer novas culturas, acredito que ele possa tentar um
primeiro contato com a vivência estrangeira por meio de um cruzeiro ou
grandes redes de resort”, afirma Ricardo Mendes.
Siqueira conta que mesmo sendo bem desenvolvidos no país, os cursos de
Educação Física
espanhóis são voltados mais para a atuação em escola ou em esportes e,
muitas vezes, o instrutor da academia é simplesmente um aluno que gosta
muito de praticar atividades físicas ou alguém que fez um curso de
musculação, por exemplo, e a avaliação física nem sempre é realizada nas
academias também. Todavia, os cidadãos buscam as atividades como meio
de obter qualidade de vida e menos para ficar em forma, como acontece
por aqui. “Eu tinha um curso da Body Systems e estava na faculdade de
Educação Física, o que me ajudou muito”, diz. O
profissional de Educação Física
lembra que os brasileiros são bem-vistos na Espanha e o nosso país é
considerado um dos melhores no mercado fitness, mas acha essencial que
além de saber bem a língua do país, que o estrangeiro respeite a cultura
do país que escolheu para estudar ou trabalhar.
Na Alemanha,
dependendo da área de trabalho, o profissional precisa de um curso
profissionalizante reconhecido pelo estado para poder assinar
formulários de assistência e prevenção de saúde por meio do esporte.
Segundo Oliveira, são cursos à distância com até três anos de duração e
presença de oito a 20 horas mensais, ou um diploma de
Educação Física.
“Fora isso, qualquer pessoa que adquira um workshop de fitness,
aeróbica, step, zumba, pilates etc pode trabalhar dando aula nas
academias sem ter diploma. Normalmente, as empresas da área de fitness
pedem só um atestado de moradia para participação e conclusão de
formação de profissionais ou o cidadão investe nas despesas de viagem
para algum evento realizado no exterior.”
Profissional de Educação Física no exterior: burocracias
Para poder ir trabalhar e estudar na Espanha, João Marcelo Siqueira
conseguiu uma carta-convite na universidade com o qual conseguiu o visto
de estudante, que lhe permitia trabalhar até 20 horas por semana. Ele
lembra, no entanto, que conseguir um contrato no país foi mais
complicado: “as questões legais de trabalho são tão burocráticas quanto
aqui”, o que faz com que muitos estrangeiros trabalhem de forma ilegal.
O
fato de ter feito um curso que lhe permitisse trabalhar em qualquer
academia da rede Les Mills ajudou Siqueira a conseguir o emprego por
conta própria, sem ajuda de alguma agência de viagens ou de emprego.
Marcio
de Oliveira lembra que o profissional “só existe estando com a situação
legalizada”. Dessa forma, para morar na Alemanha é preciso se registrar
e, para isso, é preciso um visto com permissão de trabalho e um emprego
para poder alugar um apartamento, abrir conta no banco, fazer seguro
saúde, declarar impostos etc. Assim, cuidar da parte burocrática da
entrada no país é o primeiro passo para a carreira no exterior. “O
profissional de Educação Física também tem que ter disciplina e objetivos, pois ficar longe de cada, dos amigos e familiares, não é fácil.”
Geovana
está na Nova Zelândia há três anos e recomenda que os interessados em
ir pro exterior estudem criteriosamente o país escolhido para saber como
lidar com as burocracias. “Com a internet é fácil”, ela diz, “tem que
fazer tudo dentro da lei e tudo que é requisitado pela imigração, nada
de tentar bancar o esperto. Ser honesto é a chave”. O planejamento a
longo prazo também é uma das propostas da profissional, já que mudar de
país é um processo difícil, estressante e dispendioso.
Vale a pena trabalhar como profissional de Educação Física no exterior?
Fazer uma viagem para o
exterior pode ser bastante
custoso, mas todos os entrevistados concordam que vale a pena. “Minha
intensão não era criar raízes por lá, então foi ótimo ter ido como
estudante. Pude desfrutar tudo o que queria e não fiquei pra trás no
mercado de trabalho quando voltei. Ainda tenho vontade de voltar, ir pra
Barcelona, mas hoje iria com uma mentalidade diferente, de viver lá,
construir uma carreira, mas sei que por causa da crise econômica na
Espanha desde 2008, não é um bom momento pra isso”, diz Siqueira, “na
vida profissional, essa experiência me ajudou a perder o medo da
mudança”.
Trabalhar com outros brasileiros pode ser uma opção
para quem sente muita saudade de casa e para quem precisa de dicas para
criar um network, mas como lembra Geovana, “estar em contato com pessoas
do mesmo país todo o tempo atrasa o processo de aprendizado da língua e
da cultura e causa até certa dependência dos colegas, em muitos casos, e
falta de autoconfiança”. Siqueira conta que viu muitos brasileiros
caírem nessa armadilha e afirma que eles deixaram de agarrar muitas
oportunidades por conta da falta de vivência plena da cultura local.
O
contato com outros públicos e negócios também serve para descobrir
novos nichos de mercado que podem ser explorados aqui no Brasil. Ricardo
Mendes conta que quando estava em Moscou, viu muitas famílias
frequentando grandes spas nos quais se tem academia, jacuzzi, sauna,
piscina etc. “Como é muito frio, eles têm um inverno longo, notei que
nos fins de semana as famílias inteiras frequentavam esses spas. Achei
inusitado a academia ter esse feeling de agregar a família toda, já que
eles passam umas quatro, cinco horas por lá: o pai na musculação, a mãe
fazendo bronzeamento artificial, um filho na piscina... muitos
executivos estão tendo essa sacada de oferecer serviços pra família pra
atrair uma boa clientela”, exemplifica.
“Para se fazer uma
mudança de vida desse porte é preciso ser desapegado de tudo e estar
muito focado e estar disposto a renunciar muita coisa”, diz Geovana
sobre a ida para outro país. A imersão na língua também é importante
para uma vivência plena e é preciso paciência que aos poucos se ganha
fluência na língua: “têm dias que você tem vontade de pegar o primeiro
avião e voltar, mas seu ouvido se acostuma e naturalmente as coisas
melhoram”, incentiva.
Marcio de Oliveira conta que há 20 anos
está na Alemanha: “fui convidado para trabalhar em uma academia de
ginástica aqui depois de ter conquistado o Campeonato Mundial de
Ginástica Aeróbica, por ter experiência e conhecimento de treinamento em
grupo. Com o título forte, o dono da academia conseguiu o visto e a
permissão de trabalho sem complicações. Depois de oito anos consegui o
passaporte alemão, facilitando ainda mais minhas viagens pelo mundo”,
conta numa clara referência de que arriscar outro idioma e cultura pode
valer muito a pena.
Por Jornalismo Portal EF